1960 |
A luta foi grande, não queriam deixar que fosse ao trabalho, então virei uma peste em casa, não dei mais sossego a eles, até receber o sim, vai peste trabalhar, já que não da sossego
O trabalho ofertado era em uma Oficina de Costura na Rua Silva Teles, 447 - Brás, e vamos nós a enfrentar o primeiro dia de gente grande, as cinco da manhã saindo de casa com a bolsa de ráfia vermelha carregando a marmita do almoço, chegando com a amiga naquele local onde passaria os próximos oito anos, fui levada até uma velha máquina de costura Industrial Singer e passado o serviço, era fazer barras em shorts, coisinha muito fácil para quem estava acostumada a fazer shorts inteiros.
Eu e a amiga em nossa inocência de criança resolvemos apostar quem costurava mais, quem daria a maior produção e foi uma festa para o patrão, assombramos com a produção, fomos contratadas para receber o salário de menor e já no primeiro mês fomos chamadas pelo patrão e informadas que receberíamos o salário de maior pois estávamos trabalhando mais que todos, foi uma festa, felicidade mesmo, pois assim era possível ajudar bem em casa e aos sábados quando solicitado íamos ao trabalho para horas extras e recebíamos na hora, esse dinheirinho era nosso, para comprar nossas coisas e ainda comíamos um sanduiche bauru na padaria da esquina, nada de marmita aos sábados.
Confecções Prainha |
13 anos |
O trabalho era duro, das 7:30 as 18:00 e na sexta feira a saída era 18:30 para completar as 48 horas semanais, parávamos as 18 para fazer a faxina das máquinas, do banheiro, da oficina toda, eu e a amiga não gostávamos nada de lavar banheiro, então não o usávamos, passávamos os dias sem fazer nossas necessidades fisiológicas e assim nada de lavar banheiro, mas esse estado de coisas pouco durou, em nossa inocência de crianças resolvemos fazer uma greve para informar ao patrão que não faríamos mais faxina, pois éramos costureiras e não faxineiras, chegou a sexta-feira e quando o patrão veio mandar parar as máquinas para a faxina, nunca elas trabalharam tanto, todas enfiamos a cabeça para o trabalho e pé na máquina, para que parássemos ele foi obrigado a desligar a chave geral e com aquela cara assustada "o que foi", uma das companheiras o informou que não mais faríamos faxina, ao que ele concordou em arrumar uma faxineira e assim foi, nunca mais faxina, limpávamos as máquinas apenas, nesse dia ele nos pagou lanche, e nos levou de Kombi para casa.
Datilografia |
Minha Tia Iracema me arrumou uma vaga no escritório onde ela era secretária, foi um mico total, me colocaram para datilografar duplicatas, eu sem saber datilografia estraguei todo o trabalho, voltei para casa e disse a mãe, pode arrumar minha marmita que volto para o "Seu Bichara" meu patrão na Confecções Prainha Ltda.
Pedimos ao patrão um rádio, rapidamente nos atendeu e deu para suportar o duro trabalho, ouvíamos música o dia todo, Caubi Peixoto, Ângela Maria, Miltinho, Edith Piaf, Cely Campello, Sérgio Murilo,
Elza Soares, Moacir Franco, Elvis Presley, e tantos outros da época, nosso patrão nos atendia porque éramos esforçadas no trabalho, criança trabalhando como gente grande, em pouco tempo ele alugou um salão na Rua Mendes Gonçalves e construiu o Edifício de três andares no local da velha oficina.
A volta do trabalho era demorada, horas esperando o ônibus, mas nos divertíamos pois as lojas tocavam The Beatles, quando aparecia aquele ônibus já com as pessoas penduradas na porta, nos pendurávamos também, sardinha em lata mesmo, tinha rapazes atrevidos que vinha encostar sua partes intimas com abuso, nada que um alfinetinho de cabeça não resolvesse, sem dó os espetávamos e nos víamos livres dos atrevidos.
1962 |
1963 |
Meus passeios preferidos eram no Museu do Ipiranga, aos domingos íamos em bando de meninas, passávamos a tarde por lá, sentávamos nos jardins, visitávamos o museu naquele Palácio monumental que depois vim a saber ser réplica do Palácio de Versalhes, o fusca era o carro da moda, e paquerávamos os rapazes que os possuíam, até uma tarde onde conheci o primeiro amor, aquele belo rapaz, alto de camisa social branca e calça LEE, que era nosso sonho de consumo, se aproximou, se apresentou, como já estava indo embora me acompanhou até o ponto de ônibus, pegou meu endereço e a noite foi ao Parque São Lucas me encontrar, eu nas nuvens , veio com a mesma roupa e uma jaqueta de frio, pois as noites já eram frias, me encantei, me apaixonei, ele tinha pele e cabelos cor de mel, 1,80 de altura, deslumbrante, desses que as pessoas viram o pescoço para admirar, imaginei que casava com ele, paixão total, nos víamos diariamente, pois na semana que nos conhecemos ele entrou para a Aeronáutica, tinha 18 anos eu 17 anos, meu trabalho era no caminho de volta dele, então descia e me esperava, pegávamos o ônibus lotado até o Parque São Lucas, me deixava no portão de casa e partia, aos sábados vinha me encontrar e passeávamos pela Av. São Lucas, era o tal sobe e desce, a praça da moçada, íamos até a Igreja Assembleia de Deus que era na Rua Sofia e lá atrás da igreja que era meio deserto e escuro dávamos uns abraços mais apertados, que nunca passaram de alguns beijos, durou um ano essa paixão que a todos encantava, mas a oposição foi mais forte, da parte da família dele, era o moço rico e a moça pobre e da parte de meu irmão que fez intrigas porque queria que eu namorasse o colega dele, a paixão sucumbiu, o amor não acabou, por muito tempo amarguei a dor dessa perda, mas a vida segue e nos obriga a caminhar.